Mulheres Ilustres do Brasil - Delfina Benigna da Cunha

Delfina Benigna da Cunha

Delfina Benigna da Cunha, filha do capitão mor Joaquim Francisco da Cunha Sá e Menezes e Dona Maria de Paula e Cunha, nasceu na estância de Pontal, em São José do Norte, no Rio Grande do Sul, a 17 de junho de 1791.
Vítima, aos 20 meses de idade, da varíola que grassou epidêmica na província, a terrível moléstia não conseguiu levá-la ao túmulo mas dilacerou-lhe profundamente o coração, privando-a da vista.
E assim, cega, percorreu a dura infância, chegou a adolescência, fez-se moça, sob os desvelos dos desolados pais, que não media sacrifícios para atenuar-lhe os sofrimentos. 
Em meio a tanta dor, desenvolveu-lhe espontâneo o engenho poético, que ela aproveitou para traduzir em versos candentes e harmoniosos os reflexos de sua alma. É o que se poder ver no soneto que segue, uma das suas primeiras produções:

Vinte vezes a lua prateada
inteiro o rosto seu mostrado havia
quando o terrível mal, que já sofria,
tornou-me para sempre desgraçada.
De ver o céu e o sol sendo privada,
cresceu a par de mim a mágoa impia;
desde então a mortal melancolia
se viu em meu semblante debuxada...
Sensível coração deu-me a natura,
e a fortuna, cruel sempre comigo
negou-me toda a sorte de ventura.
Nem sequer um prazer breve consigo;
só para terminar minha amargura
me aguarda o triste, sepulcral jazigo.

Tristes versos, tão naturais em quem preferiria à luz do gênio de que fora dotada, à luz da vida que a desgraça lhe arrebatara.
Mas nem todos assim foram os seus versos, havendo cânticos singelos, inspirados, talvez, em sonhos mimosos que lhe povoaram o espírito de imagens seráficas, e cânticos só próprios de quem tem o coração em festa. 
Nascida para o infortúnio, Delfina da Cunha, em 1826 passou pelo dissabor de perder seu pai e em 1833 pelo rude golpe do falecimento de sua boa mãe.
O vácuo imenso que estas duas perdas lhe abriram no coração ralado pela saudade filial, deu origem a uma justa lamentação, que assim termina:

Foi perdendo-os, que eu vi que nada via,
 e assim, duas vezes, de meus olhos,
vi sumir-se essa luz maravilhosa,
essa luz que procuro e que não acho... 
Vendo-se desamparada e só, Delfina da Cunha resolveu implorar por clemência de D. Pedro I, o que fez com estes versos:

Quem te fala, senhor, que te saúda
não vê raiar de Febo a luz brilhante;
dá-lhe pio agasalho um breve instante;
seu fado imigo, em brando fado muda.
A sustentar o peso assaz lhe ajuda,
de uma vida que à morte é semelhante;
não chegue ser aflita mendigante
quem um tal protetor roga lhe acuda. 
É por ti que eu espero ser contente,
e suponho, senhor, que não me iludo,
de tua alma a piedade está patente.
Que tenho em Pedro, o grande, um forte escudo,
creio, folgo e afirmo afoitamente
que és pai, és benfeitor, é nume, é tudo.
Atendendo aos relevantes serviços prestados por seu pai na carreira das armas, Delfina da Cunha, obteve do imperador uma pensão e assim pode publicar as poesias, que dedicou às suas práticas. 
A guerra civil rebentada na província, que durou nove anos, com inútil derramamento de sangue brasileiro, obrigou Delfina da Cunha a refugiar-se no Rio de Janeiro, onde já havia estado por ocasião de dirigir-se a D. Pedro I.
O bom atendimento que lhe dispensaram, obrigou-a a permanecer ali por algum tempo. De volta à província, onde pouco se demorou, empreendeu novas viagens ao Rio de Janeiro e à Bahia, fazendo nesse Estado duas reimpressões das suas produções poéticas, recebidas com o maior carinho pelo público baiano.
A insigne poetisa faleceu em 1857. 

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